Ex-diretor da Abin denuncia resistência do governo para investigar software espião
Brasília — InkDesign News — O ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), delegado Carlos Afonso Gonçalves Gomes Coelho, revelou nesta sexta-feira (23) resistência de servidores ao tentar investigar o uso do sistema de espionagem FirstMile, utilizado para monitoramento ilegal de autoridades públicas entre 2021 e 2022.
Contexto político
A investigação em torno do software FirstMile, empresa israelense Cognyte (ex-Verint), ganhou destaque nos processos relacionados à apuração da tentativa de golpe de Estado em 2022. Conforme apurado pela Polícia Federal, o sistema foi empregado para rastrear autoridades públicas com geolocalização de celulares, sem autorização judicial. O caso integra a operação Última Milha, que busca esclarecer a existência de uma estrutura paralela de espionagem na Abin durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O esquema, conhecido como “Abin Paralela”, monitorou ao menos 22 pessoas, incluindo parlamentares, servidores públicos, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), jornalistas e governadores.
Reações e debates
Durante o depoimento como testemunha, Coelho destacou a dificuldade em obter informações dentro da própria Abin. Ao questionar Marcelo Furtado, gestor do contrato do software, recebeu respostas evasivas e resistência:
“O gestor de contrato, quando ele foi questionado sobre a regularidade da ferramenta e para prestar outras informações, ele se mostrou recalcitrante. Posteriormente, entrou em contato comigo dizendo que não estava se sentindo à vontade para prestar o que havia sido solicitado.”
— Carlos Afonso Gonçalves Gomes Coelho, ex-diretor da Abin
Além disso, a reação do diretor do Departamento de Operações de Inteligência da Abin, Paulo Maurício Fortunato, foi de hostilidade:
“Eu tive uma interação com o diretor do Departamento de Operação de Inteligência, o oficial Paulo Maurício, ele foi agressivo, disse que eu não tinha que me imiscuir em assuntos da atividade-fim e que aquilo deveria ser tratado no âmbito da direção-adjunta.”
— Carlos Afonso Gonçalves Gomes Coelho, ex-diretor da Abin
Segundo Coelho, o assunto foi comunicado ao então diretor-geral Alexandre Ramagem e ao diretor-adjunto da Abin, que acionaram a corregedoria para apurar a contratação e uso do software.
Desdobramentos e desafios
Embora tenha prestado depoimento como testemunha, Coelho é igualmente um dos investigados na operação Última Milha. Em decisão do ministro Alexandre de Moraes, ele foi obrigado a depor como informante do juízo, sem o compromisso formal de dizer a verdade e podendo optar por permanecer em silêncio diante de questionamentos.
O caso evidencia desafios internos da Abin relacionados à transparência e à fiscalização dos sistemas de inteligência. Além disso, reforça o debate sobre os limites legais do monitoramento estatal e o respeito ao direito à privacidade, especialmente no contexto político-policial brasileiro.
As investigações da operação Última Milha prosseguem, e os desdobramentos poderão influenciar reformas estruturais e operacionais na agência, bem como políticas de supervisão e accountability em serviços de inteligência.
Fonte: (CNN Brasil – Política)
