
Shangai — InkDesign News — Cientistas identificaram uma “ordem oculta” nas regiões áridas do planeta: plantas nesses ambientes aparentemente caóticos, ao serem vistas do alto, seguem um padrão matemático chamado de hiperuniformidade desordenada. O estudo, liderado por pesquisadores da Universidade Jiao Tong de Xangai, foi publicado em outubro na revista PNAS e revela uma nova chave para a sobrevivência em ecossistemas extremos.
O Contexto da Pesquisa
Fenômenos como o “tiger bush” na África Ocidental — faixas de vegetação alternadas que lembram listras de tigre — e os “círculos de fadas” na Namíbia intrigam cientistas há décadas pelo seu aparente desordenamento, mas repetição em grande escala. A pesquisa insere-se no esforço de compreender como plantas se auto-organizam de modo eficiente para sobreviver à seca. Até então, padrões vegetais em ambientes áridos eram classificados como aleatórios ou agrupados. O conceito de hiperuniformidade desordenada, inicialmente descrito por químicos nos anos 2000, vem ganhando destaque em diversas escalas da natureza, dos cristais às galáxias.
Resultados e Metodologia
Por meio da análise matemática de imagens de satélite de mais de 400 áreas áridas pelo mundo, cerca de 10% dessas regiões exibiram o padrão de hiperuniformidade desordenada. A dispersão das plantas, embora pareça aleatória, revela-se balanceada sob uma perspectiva ampla: plantas nem demasiado próximas, o que geraria competição por água, nem excessivamente afastadas, o que abriria brechas para invasores.
“Esperávamos encontrar uma distribuição completamente aleatória ou um padrão regular agrupado… em vez disso, descobrimos um padrão hiperuniforme desordenado perfeito — uma forma de ordem oculta jamais reconhecida antes em comunidades vegetais.”
(“We expected to find either a completely random distribution or a regular, clumped pattern… instead, we uncovered a perfect disordered hyperuniform pattern — a form of hidden order no one had recognized before in plant communities.”)— Quan-Xing Liu, matemático, Universidade Jiao Tong de Xangai
A hiperuniformidade foi definida por químicos em arranjos atômicos entre sólidos e líquidos. Mais recentemente, identificou-se o mesmo padrão em cones e bastonetes dos olhos de aves e até mesmo no comportamento coletivo de algas.
Para chegar a esses resultados, os cientistas utilizaram modelagem matemática e comparação extensiva entre imagens de diferentes continentes, confirmando uma recorrência em ecossistemas secos.
Implicações e Próximos Passos
A descoberta sugere que a auto-organização hiperuniforme resulta da competição intensa por recursos escassos, promovendo resiliência ecológica. No entanto, distúrbios humanos nesses ambientes ameaçam destruir essa ordem “invisível”, reduzindo a capacidade de recuperação natural do ecossistema.
“Estradas e valas funcionam como cicatrizes, interrompendo o fluxo de água. Uma vez perturbados esses gradientes, a ‘ordem oculta’ colapsa. A perda da hiperuniformidade pode servir como um sinal precoce de alerta — indicando que o ecossistema está sob estresse e perdendo resiliência natural.”
(“Roads and ditches act as scars interrupting water flow. Once those gradients are disturbed, the ‘hidden order’ collapses. In this way, the loss of hyperuniformity can serve as a sensitive early warning sign — a signal that the ecosystem is becoming stressed and is losing the natural resilience that this hidden order provides.”)— Quan-Xing Liu, matemático, Universidade Jiao Tong de Xangai
A equipe agora planeja investigar padrões semelhantes em outros ecossistemas extremos, inclusive fora da Terra. Análises preliminares em imagens do rover Curiosity, da NASA, sugerem que clusters de pedras em Marte também exibem hiperuniformidade desordenada, não por influência biológica, mas por forças físicas como vento e gravidade.
A presença desse princípio geométrico em sistemas tão distintos sugere que a hiperuniformidade desordenada pode ser uma solução universal de eficiência sob restrição, aproximando plantas, pedras e células em seu comportamento coletivo.
Refletindo, o avanço pode criar métricas de alerta precoce sobre degradação ambiental e inspirar estratégias de conservação e restauração resilientes em zonas de risco, ampliando o horizonte de pesquisas em ecologia, física e astrobiologia.
Fonte: (Live Science – Ciência)