
Londres — InkDesign News — Um novo estudo internacional envolvendo quase 560 mil participantes e publicado na BMJ Evidence Based Medicine indica que qualquer quantidade de consumo de álcool pode aumentar o risco de demência, desafiando a ideia de que doses moderadas seriam protetoras. A pesquisa, liderada por equipes do Reino Unido e dos Estados Unidos, utilizou dados observacionais e genéticos de grandes biobancos, sendo a análise desta magnitude a mais ampla realizada até hoje sobre o tema.
O Contexto da Pesquisa
Estudos anteriores sugeriam que o consumo leve de álcool poderia ter efeito protetor contra doenças neurodegenerativas, porém eram baseados predominantemente em dados observacionais — muitos dos quais não diferenciavam entre abstêmios ao longo da vida e ex-bebedores, dificultando a inferência de causalidade. Para contornar tais limitações e fortalecer o embasamento científico, pesquisadores do Million Veteran Program (MVP) dos Estados Unidos e do UK Biobank, do Reino Unido, investigaram o impacto do álcool utilizando métodos genéticos e acompanhando adultos de diversas ancestrais, com idades entre 56 e 72 anos.
Resultados e Metodologia
No total, foram monitorados 559.559 indivíduos, dos quais 14.540 desenvolveram algum tipo de demência durante o acompanhamento. Os dados de consumo alcoólico vieram de questionários e da ferramenta AUDIT-C, que avalia padrões de consumo arriscado. Observacionalmente, verificou-se uma associação em formato de U: tanto abstêmios quanto bebedores excessivos (mais de 40 doses semanais) apresentaram riscos até 41% maiores de demência em relação aos leves consumidores (menos de 7 doses). Porém, análises genéticas (Mendelian randomization), que envolvem quase 2,4 milhões de participantes, indicaram que o risco aumenta linearmente conforme eleva-se a propensão genética ao consumo de álcool, sem benefício associado a baixos níveis.
“Nossa pesquisa desafia a noção de que baixas doses de álcool são neuroprotetoras.”
(“Our study findings challenge the notion that low levels of alcohol are neuroprotective.”)— Autores do estudo, BMJ Evidence Based Medicine
O estudo também observou que pessoas diagnosticadas com demência tendiam a reduzir o uso de álcool antes do diagnóstico. Isso sugere fenômeno de causalidade reversa nas análises observacionais anteriores.
“O padrão de redução do consumo de álcool antes do diagnóstico de demência observado em nosso estudo ressalta a complexidade de se inferir causalidade com dados observacionais, especialmente em populações idosas.”
(“The pattern of reduced alcohol use before dementia diagnosis observed in our study underscores the complexity of inferring causality from observational data, especially in aging populations.”)— Equipe de pesquisa, BMJ Evidence Based Medicine
Implicações e Próximos Passos
A principal limitação identificada é que as associações estatísticas mais robustas foram observadas em pessoas de ascendência europeia, reflexo do perfil demográfico dos biobancos analisados. Ainda assim, a robustez dos métodos empregando randomização mendeliana reforça o argumento de efeito prejudicial do consumo de álcool, mesmo em baixas quantidades, para o risco de demência. Os autores destacam a importância de políticas públicas que desencorajem o consumo, sugerindo a redução do álcool como caminho promissor para a prevenção da doença.
Apesar de limitações no extrapolamento para todas as etnias, a descoberta põe fim à crença de que doses moderadas são inofensivas para a saúde cerebral. Para especialistas em saúde pública e pesquisadores, os próximos passos incluem novas análises com outras populações e aprofundamento nas relações genéticas de risco.
As próximas investigações devem abranger grupos mais diversos e explorar intervenções populacionais para redução do consumo, com vistas à prevenção efetiva de quadros demenciais, além de elucidar possíveis mecanismos biológicos de vulnerabilidade cerebral associados ao álcool.
Fonte: (ScienceDaily – Ciência)