
Panjakent, Tajiquistão — InkDesign News — Pesquisadores revelaram uma série de fragmentos de murais no antigo Palácio Real de Sanjar-Shar, situado nas margens do rio Zeravshan, noroeste do Tajiquistão, recriando uma cena inédita de culto ao fogo. O estudo, divulgado na revista Antiquity, analisa detalhes excepcionais do ritual e lança novas dúvidas sobre práticas religiosas dos sogdianos durante o século VIII.
O Contexto da Pesquisa
Durante séculos, Sogdiana foi o eixo de uma civilização comercial entre a Ásia e a Europa, prosperando graças à Rota da Seda. Os sogdianos, povo de origem iraniana, integraram influências persas, gregas e asiáticas em sua arquitetura e ritos. O Palácio de Sanjar-Shar, erguido no século V, foi um centro de poder até ser consumido por um incêndio cerca de 300 anos depois. Desde a década de 1940, o local vem sendo escavado, revelando tesouros e painéis pintados que documentam desde cenas de caça a processões cerimoniais.
Resultados e Metodologia
A investigação recente concentrou-se nos fragmentos achados entre 2022 e 2023 em um salão retangular do palácio. Por meio de reconstrução gráfica e análise comparativa, a equipe do arqueólogo Michael Shenkar, da Universidade Hebraica de Jerusalém, reconstituiu uma cena de quatro sacerdotes acompanhando uma criança até um altar de fogo. A iconografia, inédita fora de ossuários, diverge de outras obras sogdianas que costumam retratar apenas dois sacerdotes. Destaca-se a presença do padām — máscara ritualística ainda empregada por sacerdotes zoroastristas atualmente — em ao menos um dos personagens.
“A cena de adoração ao fogo representa uma adição rara à cultura visual sogdiana, oferecendo percepções sem precedentes sobre a sociedade na véspera de sua queda.”
(“The fire-worship scene is a rare addition to Sogdian visual culture, offering unparalleled insights into Sogdian society on the eve of their downfall.”)— Michael Shenkar, Arqueólogo, Universidade Hebraica de Jerusalém
Ainda permanecem lacunas sobre os objetos portados pelos sacerdotes e o significado do ritual. Segundo Shenkar, a posição do sacerdote principal — “possivelmente ajoelhado e oferecendo incenso em um altar portátil” — sugere um rito sofisticado, mas desconectado das representações típicas, geralmente voltadas a deuses, não a altares de fogo.
“A fita estendendo-se da nuca do segundo sacerdote é um elemento atípico, já que tais adornos são usualmente associados a reis e divindades na arte sogdiana.”
(“The ribbon extending from the back of his neck is an unusual feature, as such ribbons in Sogdian art typically accompany deities and kings.”)— Michael Shenkar, Arqueólogo, Universidade Hebraica de Jerusalém
Implicações e Próximos Passos
A descoberta amplia a compreensão sobre os paradigmas religiosos e hierarquias rituais sogdianas, desafiando interpretações anteriores quanto à função dos altares e à iconografia dos sacerdotes. Especialistas avaliam que a vinculação direta entre ofertas de incenso e o culto ao fogo pode indicar evoluções doutrinais internas ou intercâmbios culturais intensificados na reta final da civilização sogdiana.
Por ora, estudiosos permanecem atentos à possibilidade de novas revelações em escavações futuras. O desejo é elucidar se rituais semelhantes eram rotineiros ou exclusivos das elites locais, e qual papel desempenharam na transição religiosa que se seguiu à conquista islâmica da região.
No horizonte, a descoberta desses murais promete instigar debates sobre integração cultural, identidade e religiosidade ao longo da Rota da Seda, ampliando o repertório de imagens e símbolos desse elo civilizatório entre Oriente e Ocidente.
Fonte: (Popular Science – Ciência)