
Gotemburgo — InkDesign News — Pesquisadores da Universidade de Tecnologia Chalmers, na Suécia, em colaboração com o Laboratório de Propulsão a Jato (JPL) da NASA, fizeram uma descoberta inédita sobre a química da lua Titã, em Saturno. O estudo, publicado em outubro de 2025, demonstra que substâncias polares e apolares normalmente imiscíveis podem se misturar sob o frio extremo, desafiando princípios tradicionais da química.
O Contexto da Pesquisa
Titã, maior lua de Saturno, há anos intriga cientistas devido à sua atmosfera rica em nitrogênio e metano, sugerindo similaridades com as condições da Terra primitiva. Pesquisadores acreditam que desvendar a química ali pode lançar luz sobre os mecanismos que possibilitaram a origem da vida em nosso próprio planeta. Perguntas fundamentais pautam a investigação: como compostos como o cianeto de hidrogênio se comportam sob as temperaturas gélidas de Titã? Eles simplesmente se acumulam ou interagem formando novas estruturas?
Resultados e Metodologia
No experimento conduzido no JPL (Califórnia), cianeto de hidrogênio foi misturado a metano e etano a cerca de 90 Kelvin (-180°C). Nestas condições, o cianeto torna-se cristalino, enquanto os hidrocarbonetos mantêm-se líquidos. Utilizando espectroscopia por laser, medidas apontaram que algo incomum ocorria, apesar de as moléculas permanecerem íntegras. Para decifrar o fenômeno, o grupo de Martin Rahm, especialista em química do cianeto na Chalmers, recorreu a simulações computacionais de larga escala, testando milhares de possíveis arranjos moleculares.
Rahm detalha:
“A questão que nos fizemos era um pouco louca: será possível explicar as medições observadas por uma estrutura cristalina composta por metano ou etano misturados ao cianeto de hidrogênio?”
(“The question we asked ourselves was a bit crazy: Can the measurements be explained by a crystal structure in which methane or ethane is mixed with hydrogen cyanide?”)— Martin Rahm, Professor Associado, Universidade de Tecnologia Chalmers
O resultado foi surpreendente: hidrocarbonetos penetraram a rede cristalina do cianeto de hidrogênio, formando estruturas estáveis denominadas cocristais. Os cálculos teóricos realizados coincidiram com os espectros de luz observados pelo laboratório da NASA, evidenciando que “esta interação inesperada pode ocorrer sob as baixas temperaturas de Titã”, afirma Rahm.
Implicações e Próximos Passos
A descoberta desafia o conhecido princípio químico “semelhante dissolve semelhante”, segundo o qual substâncias polares e apolares tendem a se manter separadas. Em Titã, essas barreiras parecem se dissipar. A pesquisa sugere novas explicações para as complexas paisagens da lua — lagos, mares e dunas compostos por metano e etano — e contribui para compreender o papel do cianeto de hidrogênio na formação de blocos fundamentais à vida, como aminoácidos e nucleobases.
Sobre a contribuição para a astrobiologia, Rahm complementa:
“A descoberta da interação inesperada entre essas substâncias pode influenciar nossa compreensão da geologia de Titã e de sua química pré-biótica. Nosso trabalho traz perspectivas sobre como a vida poderia emergir em ambientes extremos e inóspitos.”
(“The discovery of the unexpected interaction between these substances could affect how we understand the Titan’s geology and its strange landscapes…our work also contributes insights into chemistry before the emergence of life, and how it might proceed in extreme, inhospitable environments.”)— Martin Rahm, Professor Associado, Universidade de Tecnologia Chalmers
Com a chegada prevista da sonda Dragonfly a Titã em 2034, a expectativa é que estudos aprofundados revelem novas facetas destas interações químicas. Enquanto isso, o grupo de Rahm ampliará as pesquisas em colaboração com a NASA, explorando como moléculas apolares podem se incorporar ao cristal de cianeto e o que isso implica para as origens da vida no universo.
A investigação abre campo para revisões nas noções clássicas de química e potencialmente expande a compreensão sobre química prebiótica em ambientes mesmo além de Titã, podendo influenciar estudos em atmosferas planetárias, nuvens interestelares e cometas.
Fonte: (ScienceDaily – Ciência)