
Berkeley, Califórnia — InkDesign News — Um marco da pesquisa em bioquímica foi atingido em 23 de outubro de 2007, quando um grupo liderado por Carolyn Bertozzi, da Universidade da Califórnia, Berkeley, publicou um método químico inovador para observar moléculas em organismos vivos em tempo real. A descoberta, baseada em reações de “química click” adaptadas ao ambiente biológico, permitiu visualizar glicanos essenciais das células sem interromper suas funções vitais.
O Contexto da Pesquisa
Por décadas, os glicanos — carboidratos complexos presentes na superfície das células — desafiaram cientistas que tentavam visualizá-los em ação. Embora fundamentais nos processos inflamatórios e no desenvolvimento de doenças, rastrear esses compostos em células vivas era inviável devido à falta de métodos não invasivos e suficientemente seletivos.
Carolyn Bertozzi e seu laboratório enfrentaram o desafio ao buscar alternativas à química tradicional, que é inadequada para ambientes celulares por gerar subprodutos e exigir múltiplos passos enzimáticos. Inspirando-se nos conceitos de “química click” lançados por K. Barry Sharpless, do Scripps Research, e Morten Meldal, da Universidade de Copenhague, Bertozzi afastou-se do uso tradicional de cobre, considerando sua toxicidade para células vivas.
“A reação era extremamente poderosa e rápida, ocorrendo mais de 99,9% das vezes, sem produzir subprodutos.”
(“The reaction was extremely powerful and quick, and it occurred more than 99.9% of the time, without producing any byproducts.”)— K. Barry Sharpless, Pesquisador, Scripps Research
Resultados e Metodologia
A inovação central consistiu em forçar a molécula de alquina a adotar uma estrutura em anel, eliminando a necessidade do catalisador tóxico. Em 2004, o grupo de Bertozzi demonstrou que a reação entre azida e esse tipo de alquina permitia etiquetar glicanos em células vivas sem danos, e, em 2007, aplicou a técnica para visualizar glicanos em células de hamster.
O procedimento experimental envolvia a incorporação de um carboidrato modificado com azida nas células vivas. Posteriormente, ao adicionar uma alquina cíclica conjugada a uma proteína fluorescente verde, a “química click” ligava as duas estruturas, permitindo observar literalmente onde os glicanos estavam localizados.
“Isso nos permitiu rastrear moléculas em organismos vivos com precisão sem interferir nos processos biológicos.”
(“Her work on bioorthogonal click chemistry enabled us to better visualize living cells in action.”)— Carolyn Bertozzi, Professora de Química, Universidade da Califórnia, Berkeley
Esta abordagem, denominada “química click bio-ortogonal”, é assim chamada por ser ortogonal — ou seja, não interferir — aos sistemas biológicos naturais da célula.
Implicações e Próximos Passos
A metodologia de Bertozzi teve impacto imediato na visualização de biomoléculas em embriões de peixe-zebra, no rastreamento de glicanos que protegem células cancerígenas do ataque do sistema imunológico e no desenvolvimento de traçadores radioativos para imagens biomédicas. Adicionalmente, a química click se tornou ferramenta chave para acelerar descoberta de medicamentos inovadores, com potencial para transformar a fabricação farmacêutica e o diagnóstico clínico.
A consagração do avanço veio em 2022 com o Nobel de Química concedido a Sharpless, Meldal e Bertozzi. O futuro da área aponta para a integração da técnica em análises mais complexas de tecidos e organismos inteiros, abrindo possibilidades para monitoramento em tempo real de processos patológicos e terapêuticos.
À medida que novas adaptações surgem e aplicações avançam, pesquisadores preveem que técnicas bio-ortogonais se tornarão padrão não só na pesquisa fundamental, mas também em aplicações clínicas, incluindo terapia dirigida e rastreamento de doenças em estágios iniciais.
Fonte: (Live Science – Ciência)