
Barcelona — InkDesign News —
Uma pesquisa internacional, publicada em setembro de 2024 no periódico Nature Physics e co-liderada pelo Instituto Catalão de Nanociência e Nanotecnologia (ICN2), revela que o gelo pode gerar eletricidade quando deformado de maneira assimétrica, fenômeno conhecido como flexoeletricidade. O estudo, realizado em colaboração com a Universidade Jiaotong de Xi’an e a Stony Brook University, pode revolucionar a compreensão sobre a eletrificação de nuvens e a origem dos raios.
O Contexto da Pesquisa
A ciência há décadas investiga a estrutura e os comportamentos do gelo, componente primordial dos ambientes naturais da Terra, como calotas polares e montanhas. Apesar de sua abundância, muitos mistérios sobre suas propriedades eletromecânicas permaneciam, especialmente sobre como partículas de gelo em nuvens de tempestade adquirem carga elétrica, contribuindo para a formação de descargas atmosféricas.
Resultados e Metodologia
No estudo liderado pelo ICN2, pesquisadores mediram, pela primeira vez, a capacidade do gelo comum de gerar eletricidade ao ser submetido a deformações mecânicas não-uniformes. Uma camada superficial de gelo apresentou ainda comportamento ferroeletrônico a temperaturas abaixo de -113ºC (160 K), polarizando-se eletricamente de forma reversível diante de campos aplicados.
“Descobrimos que o gelo gera carga elétrica em resposta ao estresse mecânico em todas as temperaturas. Além disso, identificamos uma fina camada ‘ferroelétrica’ na superfície a temperaturas abaixo de -113ºC (160K). Isso significa que a superfície do gelo pode desenvolver uma polarização elétrica natural, reversível por um campo externo – similar ao que acontece com os polos de um ímã.”
(“We discovered that ice generates electric charge in response to mechanical stress at all temperatures. In addition, we identified a thin ‘ferroelectric’ layer at the surface at temperatures below -113ºC (160K). This means that the ice surface can develop a natural electric polarization, which can be reversed when an external electric field is applied — similar to how the poles of a magnet can be flipped.”)— Dr. Xin Wen, Pesquisador, ICN2
Os testes envolveram blocos de gelo posicionados entre placas metálicas, monitorando o potencial elétrico gerado ao serem encurvados, com resultados compatíveis aos medidos em colisões de partículas de gelo em nuvens.
“Durante nossa pesquisa, o potencial elétrico gerado ao dobrar uma laje de gelo foi medido. Os resultados correspondem aos observados em colisões de partículas de gelo em tempestades.”
(“During our research, the electric potential generated by bending a slab of ice was measured. The results match those previously observed in ice-particle collisions in thunderstorms.”)— Prof. Gustau Catalán, ICREA, ICN2
Implicações e Próximos Passos
Os achados sugerem um papel potencial da flexoeletricidade na eletrificação das nuvens, elucidando parcialmente a origem dos raios. Além do impacto sobre o entendimento de fenômenos naturais, a nova propriedade coloca o gelo em pé de igualdade com eletrocerâmicas, ampliando oportunidades para o desenvolvimento de sensores, capacitores e dispositivos eletrônicos operando em ambientes frios.
Segundo os pesquisadores, novas investigações buscam explorar as aplicações práticas da flexoeletricidade e ferroelectricidade do gelo. Ainda que prematuro prever soluções tecnológicas, a descoberta pode abrir caminho para a criação de eletrônicos que utilizem o gelo como material ativo, especialmente em regiões polares.
O aprofundamento dessas linhas poderá revelar formas inéditas de captação de energia ou detecção ambiental, além de lançar luz sobre processos atmosféricos críticos. O avanço coloca o gelo no centro das atenções tanto da ciência básica quanto de potenciais aplicações industriais e ambientais.
Fonte: (ScienceDaily – Ciência)